Água para todos | Juliana Monachesi

Eduardo Srur, Pazé e Sonia Guggisberg integram a exposição “Mergulhos”, como resultado do convite pelo Sesc Pinheiros para desenvolverem trabalhos especialmente sobre o tema do projeto Sesc Verão 2007, “Esporte para Todos”, _que ocorre durante dois meses em todas as unidades do Estado de São Paulo, com o objetivo de divulgar e incentivar a cultura da prática esportiva.

Os três artistas têm marcantes trabalhos de arte pública em suas trajetórias. Srur realizou intervenções em um edifício da av. Doutor Arnaldo e no rio Pinheiros; Pazé criou uma obra circulante para o centro de São Paulo; Guggisberg instalou esculturas de grandes dimensões em quatro regiões da cidade. E os três, ao responder ao convite do Sesc, optaram por utilizar a piscina e a relação estabelecida entre o corpo dos usuários e a natação como ponto de partida para suas criações.

A piscina pública é a praia dos paulistanos. Eduardo Srur propõe um jogo pictórico e conceitual ao dispor mais de 20 pranchas suspensas no ar em uma onda imaginária que se estende da sala de exposição até o teto da piscina. A instalação, intitulada “Surf-ar”, reúne, como em outras instalações do artista, o prazer visual e o conteúdo político: da piscina ou da sala, e até do restaurante, as pessoas têm perspectivas diversas para apreciar a obra, enquanto a síntese entre praia e piscina chama a atenção para a existência de espaços democráticos de lazer em São Paulo.

Pazé também investiga, por outro viés, a sociabilidade na água. Ponto de encontro e espaço para lazer, a piscina agrega _mais do que qualquer outra dependência do Sesc_ pessoas de todas as idades e procedências. No vídeo que o artista apresenta, que foi filmado em baixo d’água, na piscina do Sesc Vila Mariana, os diversos usos deste espaço são flagrados do ponto de vista de quem nada: a mãe com o bebê, as senhoras que se reúnem para fazer hidroginástica e conversar, crianças e adultos nadando, casais de namorados.

A visão submersa, naturalmente turvada pela densidade da água, vai revelando, com o decorrer do tempo, a distensão temporal que se experimenta na água. Os personagens do vídeo, cujas cabeças mal aparecem, são plenamente corporais: um devir-corpo, para usar a expressão de Deleuze. Na piscina, todos partilham sem problemas o espaço delimitado, mergulham em si mesmos, protagonizam inconscientemente uma dança delicada e mágica. O vídeo de Pazé é mágico e delicado, silencioso, introspectivo e meditativo. É como nadar.

Sonia Guggisberg flagra esse contexto pelo avesso. Nos objetos, com imagens de uma nadadora contidas em bolhas de plástico, assim como no vídeo projetado no chão que mostra um nadador esforçando-se para se mover na piscina, a questão da imobilidade é frisada. O nadador tem seus movimentos contidos por uma corda: ele nada e nada até a exaustão sem sair do lugar. A nadadora está também restrita em seus movimentos, além de aprisionada dentro da bolha.

Conhecida por trabalhar sempre com materiais moles em suas esculturas, que ganham configurações diferentes a cada vez em que são expostas, a artista insere no trabalho a figura humana paradoxalmente imóvel. A água serve aqui como metáfora de seu revés. Fluxo e refluxo convivem nesse conjunto de obras de Sonia Guggisberg, uma vez que elas tratam da ilusão contemporânea de mobilidade constante. Movimenta-se muito para deslocar-se muito pouco.

“Mergulhos” reúne obras que ativam a imaginação do visitante e o colocam em um transe semelhante àqueles experimentados quando se está debaixo d’água: suspensão dos pensamentos e deleite, ou plena ação cerebral e insights reveladores.